Texto de Tatiana Gianini, publicado em edição impressa de VEJA
À FALTA DE CEMITÉRIO,…
…prefeituras chinesas subsidiam os funerais em alto-mar.
Com a valorização imobiliária e o envelhecimento da população, há menos
espaço para enterrar os mortos
No país mais populoso do mundo, enterrar os parentes mortos é uma
missão árdua. Com 1,3 bilhão de habitantes, a China enfrenta o desafio
de manter as tradições de culto aos falecidos em meio à demanda em alta
por espaço urbano. A política do filho único aumentou a proporção de
idosos na população e, com isso, elevou a taxa de mortalidade.
No país, registram-se 7,1 mortes por 1000 habitantes. No Brasil, em
comparação, o dado é de 6,4. Quase 10 milhões de pessoas morrem a cada
ano na China. O número deve dobrar até 2025. A quantidade de cemitérios
não tem aumentado na mesma proporção. Em Xangai, onde o problema é mais
grave, estima-se que não haverá sepulturas disponíveis no prazo de sete
anos.
A solução é cremar os mortos e lançar as cinzas no mar. O ritual é
realizado em grandes embarcações administradas pelas agências
funerárias. As famílias chegam às docas logo pela manhã, já com as urnas
dos parentes em mãos. Longe da terra, as cinzas são misturadas com
pétalas de flores e lançadas na água. Esse procedimento fúnebre conta
com subsídios estatais em Xangai e em outras dez cidades.
Na maior metrópole da China, com 20 milhões de moradores, os enterros
no mar ainda representam apenas 1,5% dos funerais, mas a modalidade
cresce a uma taxa de 10% ao ano.
Na China, onde as tradições milenares duram até o próximo decreto do
Partido Comunista, os funerais no mar são uma tendência recente. Em
1949, ano da Revolução Comunista, Mao Tsé-Tung instituiu que todos os
mortos deveriam ser cremados. O objetivo era evitar que as terras
produtivas se convertessem em amplos cemitérios.
Hoje, a cremação ainda é a regra, principalmente nas cidades. Mas os
chineses preferem enterrar as urnas com as cinzas, porque muitos
acreditam que a alma só descansa em paz se o corpo que ela habitava
repousar em terra firme. A falta de espaço, contudo, elevou o valor dos
terrenos e inibiu a construção de cemitérios.
Nas grandes metrópoles, o preço de um jazigo para uma urna é de 24000
iuanes, ou 8300 reais, o equivalente a sete meses de salário, em média,
de um trabalhador chinês. As famílias também precisam arcar com os 200
reais da cremação. Nos últimos anos, os custos elevados obrigaram os
chineses mais pobres a usar praticamente as suas economias de toda a
vida para pagar o enterro dos pais.
Para esses antigos “escravos do túmulo”, como ficaram conhecidos, os
funerais no mar, a custo zero, são uma forma mais leve de se despedir de
seus entes queridos.
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