Leonardo Cavalcanti
A partir de histórias de bastidores e do número de desistências de
servidores qualificados das Forças Armadas, uma pergunta se impõe: qual
é de fato a estratégia do governo Dilma para a área militar? Enquanto
tal resposta não vem, a Defesa perde, cada vez mais, gente preparada.
Um pacto de silêncio foi quebrado. Integrantes da elite das Forças
Armadas decidiram falar pela primeira vez sobre a fuga de talentos para a
iniciativa privada e para outras áreas do serviço público.
Internamente, a preocupação com o tema levou o Exército a preparar
estudos para explicar o óbvio: o percentual das desistências, iniciadas
há pelo menos sete anos, sempre esteve ligado aos baixos salários. Com
as ofertas cada vez mais tentadoras vindas de fora dos quartéis, apenas
no ano passado, 245 oficiais abandonaram o posto — um número quase
constante e iniciado em 2006, segundo levantamento apresentado na
reportagem publicada por este Correio no último domingo.
A partir de relatos de coronéis e capitães, dados de forma anônima, e
histórias de quem largou a farda, foi possível montar um quadro
atualizado da situação das Forças Armadas no país. Nos primeiros três
meses deste ano, 54 oficiais já deixaram a Marinha, o Exército e a
Aeronáutica. A reportagem, assinada por Karla Correia, apresenta
comparações de salários. Numa delas, pilotos de caça com a patente de
coronel se aposentam com rendimentos líquidos de R$ 9,3 mil, incluídos
soldo e adicionais. Pilotos de helicópteros, a depender do tipo de
serviço, podem receber R$ 25 mil mensais. O debate aqui está no tanto
que o Estado investiu na capacitação dos militares nas escolas de
formação.
Cálculos conservadores apontam que a União gasta R$ 1,2 milhão para
formar um oficial em uma das cinco instituições de ensino militar: as
academias Militar das Agulhas Negras e a da Força Aérea, a Escola Naval e
os institutos Militar de Engenharia (IME) e Tecnológico da Aeronáutica
(ITA). Assim, concordamos em pagar pelo ensino de uma elite militar que
abandona o barco. A culpa, porém, parece não ser dos militares. “Deixei o
coração no Exército, mas a pátria não começa no quartel, ela começa na
família. E quando a família sofre, não tem vocação militar que aguente”,
diz um dos entrevistados. O mais significativo é a incapacidade de o
serviço público segurar talentos e gente preparada.
Sem funcionários capacitados e criativos, é impossível para qualquer
gestor definir prioridades e ações de políticas públicas. Ao perder
cérebros nas Forças Armadas, o Brasil perde também a possibilidade de
aplicar estratégias de defesa, principalmente como guardiã das
fronteiras e da plataforma continental. Tudo piora com uma tropa
desestimulada. Ao longo de uma conversa com o Correio, um coronel
resumiu o conflito nos quartéis: “Nada pior para um profissional do que
atuar sem perspectiva de futuro. É assim que vivemos”. Uma pergunta se
impõe: qual é de fato a estratégia do governo Dilma para a área militar?
Enquanto tal resposta não vem, perdemos oficiais.
Correio Braziliense/montedo.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário